Especial 22 de abril – O que os livros didáticos chamam de “Descobrimento” os enredos carnavalescos chamam de “Invasão”
Há um ditado popular que diz que uma mentira contada inúmeras vezes, de tanto ser repetida, acaba se tornando verdade. E foi seguindo por esta via que os livros didáticos nos contaram a história de um Brasil “descoberto” em 22 de abril de 1500. Fizeram questão de manipular a verdade dos fatos históricos e transformaram invasão em ocasional descoberta e exploração em amistosa civilização. Ora, fato é que muito antes da primeira nau europeia despontar no horizonte da costa brasileira, já havia brasilidade cá por essas bandas! Havia povos originários praticando a medicina das florestas e comunicando-se com seus dialetos próprios, respeitando a natureza e seus ritmos internos; reverenciando seus deuses, praticando sua cultura e desenvolvendo sua espiritualidade com a sabedoria ancestral. Sendo assim, não há lógica em acreditar nessa versão ultrapassada de que o Brasil foi descoberto. Verdade é que o que aconteceu naquela ocasião foi o início de um ciclo de apagamento histórico a partir de uma ocupação forçada e sustentada pela romantização da colonização que resultou em muita violência e genocídio. Se por um lado os livros escolares manipularam a história verídica, por outro lado houve a coragem de uma escola de samba contá-la na avenida (e na íntegra)! É no Carnaval que o Brasil vê a oportunidade de se olhar no espelho e, genuinamente, se reconhecer. Em 2019 a Estação Primeira de Mangueira foi para a avenida com o enredo “História pra ninar gente grande” e recontou a História do Brasil, porém, sem eufemismo: “… Brasil, meu nego deixa eu te contar a história que a História não conta, o avesso do mesmo lugar, na luta é que a gente se encontra… Brasil, meu dengo a Mangueira chegou com versos que o livro apagou, desde 1500 tem mais invasão do que descobrimento, tem sangue retinto pisado atrás do herói emoldurado. Mulheres, tamoios, mulatos, eu quero um país que não está no retrato”. Esse trecho do samba-enredo é um verdadeiro manifesto, uma nota de repúdio e uma aula de reeducação popular que leva a questionar tudo o que os livros didáticos mantiveram escuso acerca da história do país. É, ainda, um resgate das memórias e dos sujeitos invisibilizados histórica e socialmente. É um ato de justiça social e cultural. Salve o Carnaval que a cada ano vem se revelando como o mais genuíno e grandioso espetáculo de sabedoria, conhecimento e manifestação popular!
Nota da Semana
O projeto “Todo Mundo no Rio” é uma iniciativa da prefeitura do Rio de Janeiro e patrocinadores que visa realizar shows anuais até 2028, cujo foco é atrair ainda mais turistas para a cidade, especialmente no mês de maio, aquecendo assim a economia de diversos setores, além de impulsionar o turismo. Após Madonna em 2024, Lady Gaga se apresenta neste ano, consagrando o Rio no cenário global da cultura. O referido projeto promete causar importantes impactos econômicos como a criação de empregos diretos e indiretos, tanto na produção dos shows como em atividades relacionadas.
“Fantasias Textuais”
Ela fez menção de modular o ímpeto da saudade que lhe ardia no peito e queimava-lhe a alma. Sem hesitar, pôs-se a discar, não quaisquer números, mas os que a aproximariam da voz rouca que, ao ouvi-la na linha, emudeceu emitindo apenas o som ofegante de uma vigorosa respiração, pondo-se a escutar o que ela, em desassossego de amor, tinha a dizer acerca do real sentido do que vem a ser esse mesmo amor:
-Poesia é amor
Viver é poesia
Poesia é harmonia no caos
Amor é letra perfeita com melodia
Poesia, no afã, é essencial
Amor, no divã, sinceridade
Poesia pela manhã
É movimento natural
Amor, meu talismã
Alçapão que aprisiona à genuína liberdade
Poesia é amor
Amor é pura sentimentalidade
Poesia singra entre o prazer e a dor
Amor veleja nas águas da cumplicidade
Entre marés que falam de poesia e amor
Lanço âncoras profundas no porto da saudade.
“Amor é poesia”. Eliane Gentile, 6 de julho, Inverno de 2023.